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domingo, 8 de fevereiro de 2015

Aquecimento e ventilação das colmeias.



Um artigo num blog em inglês chamou-me a atenção por ser um assunto que sempre me intrigou - devem as colmeias ser ventiladas ou não? E se sim, em que medida? Não sendo eu um expert em inglês, fiz uma tradução do artigo podendo este conter alguns erros que peço desde já desculpa. Nas referencias às colmeias obviamente foram utilizadas colmeias com modelos locais (do Reino Unido).


O Artigo original em inglês encontra-se em /https://oxnatbees.wordpress.com/2015/01/25/warm-hives/

"Recentemente fui a uma palestra brilhante organizado pela OBKA dada por Derek & Elaine Mitchell, que têm feito alguma pesquisa rigorosa sobre o isolamento das colmeias e os seus efeitos. Eles apresentaram os seus resultados para uma publicação no Journal of Apicural Research. Aqui estão alguns pontos-chave que marquei:


P: Porque é que muitas fontes dizem que colmeias precisam de muita ventilação ao passo que outras referem que o calor necessário à sobrevivência duma colonia depende de ventilação mínima?


R: Grande parte das pesquisas foram feitas por altura da 2 ª Guerra Mundial, por exemplo, houve um livro-chave publicado em 1947, e naqueles dias a madeira era escassa e eles não tinham acesso a isoladores modernos como poliestireno. As colmeias eram de paredes finas e frias. Nessas condições, para evitar mofo húmido seria necessária muita ventilação! Mas nos dias de hoje, podemos fazer colmeias muito mais quentes, que imitam as árvores ocas onde as abelhas evoluíram, e, neste caso, alta umidade é melhor (alta umidade ajuda as larvas e ovos a sobreviver e dificulta o desenvolvimento da varroa) e não há paredes frias onde a humidade possa condensar e promover o crescimento de fungos. Para uma colmeia bem isolada, a ventilação é indesejável. Para além da existência de alta humidade decorrente de colmeias bem fechados, as altas temperaturas impedem reprodução da varroa, ajudam a suprimir a nosemose e cria de giz (ascosfariose), promove o comportamento higiénico (que também pode ajudar no controlo da varroa). No compito geral, melhor isolamento térmico reduz a mortalidade precoce – criação resfriada pode não viver por muito tempo, mesmo que eclodam posteriormente as abelhas adultas.

Curiosamente, embora não se descrevendo como um apicultor naturalista, Elaine Mitchell parou os tratamentos à varroa. Suas super-isoladas colmeias Nacionais, que usam arames e fundação, continuam a ter alguma varroa, mas nunca em número alto o suficiente para prejudicar as colônias.


P. As abelhas não usam mais energia quando estão ativas? Colônias que são muito bem isolados não parecem se agrupar no inverno – não irão elas usar as suas reservas muito rapidamente?

R. Não, elas não usam mais energia. Este é um equívoco baseado em experimentos sobre a taxa metabólica, onde foram realizadas em abelhas no ar a temperaturas controladas. Se elas podem aquecer a colmeia para um ponto confortável, elas não precisam de muita energia para se manterem vivas - a chave é fornecer um ambiente que pode aquecer a um custo mínimo. Uma cavidade bem isolada, em outras palavras.



P. Que tipo de colmeia tem o melhor isolamento?


R. Os palestrantes fizeram alguns testes intensivos (2,3 milhões de medições!) Em 8 tipos de colmeia (12 colmeias no total). Para uma entrada de 20 watts - o que equivale a queima de 20 colheres de chá de mel por dia - eles viram os seguintes aumentos de temperatura (houve uma disseminação de resultados, esta é a minha estimativa do eixo dos gráficos por eles exibidos) -
(Paredes espessas 6 polegadas) Cavidade natural em árvore  - 60 graus C
Colmeia Skep , selada com esterco de vaca - 22 C
Colmeia em Poliestireno (vários tipos) - 22 C
Colmeia Warre, paredes pouco mais de 1 polegada de espessura, 4 polegadas de serragem grossa no topo - 16 C
Colmeia Top Bar queniana com barras de espessura superior, diretamente sob um telhado plano - 14 C
Madeira Nacional - 7 C a 10 C

Eles não têm acesso a colmeias WBC (a dupla parede na colmeia Nacional) ou à Langstroth de madeira (a equivalente americana da colmeia Nacional). As colmeias de poliestireno foram: 4 Nacionais, 1 Langstroth, 1 Núcleo, e um poli 14 × 12.



Outros pontos-chave

Colônias usam muito mais energia para reunir e evaporar néctar, na Primavera e no Verão, do que para sobreviver durante o inverno. A evaporação funciona muito melhor em altas temperaturas. Então pode-se concluir que o isolamento é mais importante num clima quente do que frio! È a fazer mel que elas usam energia intensiva, não para sobreviver ao inverno. Um agricultor do Reino Unido tem 1.000 colmeias em madeira e 1.000 colmeias de poliestireno. Ele faz mais mel de suas colmeias poli e está mudando as outras o mais rápido possível.
Uma razão das colmeias skeps serem tão eficiente é que elas se ajustam à forma do aglomerado bem - não há nenhum volume morto ao calor, e têm uma boa relação de área de superfície para volume.


Derek & Elaine vão apresentar esta palestra novamente na Convenção da Primavera BBKA."




sábado, 31 de janeiro de 2015

O Arranque 2015

Desde meados de janeiro - um pouco mais cedo ou tarde consoante a localização - que se nota um arranque nas colmeias. Muito pólen amarelo a entrar nas colmeias provinda das Camélias, Margaridas, Erva-azeda e da "interminável" Bânccia. Em algumas zonas muita entrada de pólen branquinho dos Eucaliptos. Todas as colmeias sempre que tem oportunidade trabalham com grande afinco. Ao inspecionarmos o interior, nota-se boa postura das rainhas.
Margaridas

A Erva-abelha, alguns citrinos e sobretudo o Incenso já mostram os rebentos de folhas novas indicando o inicio da floração para breve. Quem ainda não iniciou a estimulação das colmeias para esta floração arrisca-se a atrasar-se pois o mau tempo nem sempre permite uma recolha continua do pólen e néctar da natureza. É tempo de estimular, é tempo de preparar ceras, caixas, é tempo de preparar a exploração para a época produtiva que se avizinha.

Uma boa api

sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Final de ano - ponto de situação



Dezembro de 2014, contrariamente ao ano passado, o tempo é de alguma escassez na floração aqui em S. Miguel. A erva azeda (trevo amarelo) teima em não florir embora já haja pontualmente aqui e ali algumas flores. As nespereiras já praticamente não possuem flores. A erva-abelha está em quase todas as zonas despida de vigor. O Eucalipto está em flor mas não abrange todas as zonas da ilha. Resta a Bânccia que tem tido uma floração bastante perlongada no tempo e que tem feito as abelhas trabalharem com algum afinco. 
Flor de Eucalipto

Pontualmente também tem aparecido precocemente algumas florações de início de ano mas ainda nada de relevante. As abelhas hibridas de predominância amarela tem trabalhado bem enquanto que as escuras parecem adormecidas. Hoje, curioso com a inercia de uma das minhas colonias de abelha escura (predominantemente iberiensis) abri a colmeia, só para ver que no interior havia muitas abelhas a cobrir os 10Q de ninho e boas reservas de mel. Trabalhar é que “tá quieto” nem se dão ao trabalho de puxar ceras embora muitas vezes a temperatura esteja à volta dos 15c. Ao lado, outra colmeia de abelhas escuras, a que costumava ser mais forte nos últimos tempos deste meu apiário, embora se note abelhas à entrada, trabalhar também é muito pouco. Já todas as colmeias de predominância amarelas (lingústica) têm-me agradado pelo trabalho no exterior e desenvolvimento no interior dos ninhos. É de lamentar que não tenha havido um trabalho de apuramento das raças existentes na ilha, sem dúvida que hoje um apicultor teria o seu trabalho muito mais recompensado a nível de produtividades. Hoje, fazer seleção de rainhas com “raças” hibridas é quase como dar tiros no escuro, nunca se sabe bem como serão as filhas, se serão mansas ou agressivas, se serão produtivas ou higiénicas, enfim, quase um verdadeiro totoloto.

Em janeiro, começarei a fortalecer com xarope as colónias produtivas mais debilitadas a ver se este será um bom ano de incenso.
Boa api.

sábado, 13 de dezembro de 2014

Transumância – sim ou não


A transumância assume para alguns apicultores semiprofissionais e para profissionais uma importância de relevo. Embora alguns apicultores de dimensão considerável optam por não fazer transumância, a verdade é que a maioria aposta nesta vertente que pode se tornar num fator muito lucrativo.






Os benefícios

Na Califórnia existem plantações de amendoeiras de aproximadamente 47 mil hectares de área que mobiliza quase um milhão de colmeias para a sua polinização, ou seja quase metade de todas as colmeias existentes nos Estados Unidos. Se todos os apicultores portugueses fossem chamados a polinizar as plantações de amendoeiras na Califórnia com todas as suas colmeias, ainda seriam necessários outro tanto de colmeias para conseguir satisfazer essa demanda. Um apicultor que coloque 2000 colmeias a polinizar uma plantação de amendoeiras pode lucrar algo como 250 mil euros, ou seja, poderia o apicultor viver só dessa polinização “descansando” o resto do ano.
Campo de amendoeiras na Califórnia


Na Europa embora não exista grandes concentrações de áreas profissionalmente polinizáveis como nos Estados Unidos, já existem muitas monoculturas que contratam os serviços das abelhas. Em Portugal existem imensos apicultores que fazem transumância embora a maioria não receba por deslocar suas abelhas, certo é que as produções de mel podem triplicar ou até quadruplicar.

Nos Açores, a transumância que é praticada sobretudo para zonas de “conforto”, ou seja, o apicultor muitas vezes desloca suas colónias para apiários mais próximos de sua habitação na época baixa e redeslocando essas colónias para zonas de boa floração como por exemplo para o incenso. (deslocar um núcleo para uma estufa de ananás conta como transumância?)

Os custos

Tudo parece um mar de rosas até aqui: lucro monetário, altas produtividades etc. mas falta falar da parte dos malefícios. Transportar colmeias de uma zona para outra zona acarreta (como é que se chama aquilo?) custos! (é isso). O primeiro custo direto é mão-de-obra necessária para tais operações. Hoje utiliza-se muito as gruas mecânicas que diminuem muito a necessidade de mão-de-obra mas esta em nunca pode ser 100% dispensada por mais eficiente que possa ser a grua. Um outro custo direto destas operações é o aluguer ou, no mínimo, os combustíveis para as carrinhas ou camiões de transporte de colmeias. Estes são os custos diretos e óbvios da transumância, mas não se fica por aqui.

Um grande custo que muitas vezes é desconsiderado pelos apicultores que se iniciam na arte de transumar, é o número total de perda de colónias devido à deslocação. Isto deve-se em parte ao transporte das colmeias onde muitas vezes as abelhas não têm o devido arejamento, ou à rainha que morre esmagada, ou simplesmente ao stress do transporte que causa inúmeras baixas. É frequente observar no dia imediatamente a seguir ao assentamento das colmeias, muitas abelhas mortas em frente à colmeia. 
Um outro custo indireto da transumância é a qualidade da alimentação das colónias. Numa monocultura é frequente as abelhas ficarem desnutridas pela falta de variedade de alimento, mais especificamente no pólen. O pólen das flores é diferente em cada tipo de flor. Numa monocultura de girassol por exemplo, a variedade de pólen é nula. Ora, isso equivaleria para nós humanos que passássemos a comer simplesmente maçãs todos os dias. Embora seja um alimento saudável, viver só de maçãs vai nos trazer certamente muitos problemas de carências nutricionais. Nas abelhas, cuja esperança de vida se situa nos 45 dias nas épocas de maior atividade, equivale a viver alguns anos só de “maçãs”. O resultado disso são colmeias fracas com abelhas já a emergirem dos alvéolos debilitadas e vulneráveis a doenças e à morte precoce. O famoso fenómeno CCD tem sido atribuído por muitos pelo recurso excessivo à transumância. Um outro custo da transumância para monoculturas agrícolas, è a exposição das abelhas a agrotóxicos nefastos. Ou seja, para além das abelhas terem de viver só de “maçãs” estas “maçãs” ainda vêm com uma gota de veneno.

 A nível mundial muito se tem debatido sobre os efeitos nefastos da agricultura intensiva e mais cedo ou tarde, isto terá reflexão direta na sua zona de residência se é que já não se repercute. Não é sem motivo que um dos maiores apicultores dos Estados Unidos, Mike Palmer, com cerca de 15 mil colónias, deixou de recorrer à transumância para se tornar num apicultor fixista.

Nos Açores a questão de transumar ou não, não creio que seja uma questão central para o sucesso na apicultura. Mas precisamente por isso, os apicultores açorianos tem uma “obrigação” acrescida de escolher bem as localizações para seus apiários. O bom desempenho da sua apicultura está intimidante relacionado com este fator.

Uma excelente apicultura

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

Alimentação artificial – açúcar invertido



Chegados que estamos ao final da época apícola, resta-nos fazer um acompanhamento mais passivo do que ativo das nossas colónias de forma a garantir a que resistam ao inverno e entrem em força na primavera. Das poucas coisas que um apicultor pode fazer diretamente no apiário é garantir essa boa chegada à primavera por prover alimentação adequada, pois é com esta alimentação que precavemos que as colónias morram à fome ou como consequência das baixas reservas, que morram de frio. 


Há várias formas de confecionar alimento para as abelhas. Hoje resolvi fazer uma pequena dissecação acerca da alimentação energética que tem como base o chamado açúcar invertido. 


Existem diferentes formas de confecionar e administrar açúcar às colónias:
  • A mistura 1:2 ou seja, uma parte de açúcar e duas partes de água. Essa mistura é mais indicada para alturas em que o calor abunde e serve para estimular a postura da rainha.
  • Há a mistura 1:1, ou seja, uma parte de açúcar e uma parte de água que é a composição mais próxima do nível de teor de açúcar do néctar natural das plantas. Serve para as abelhas “puxarem” cera, para alimentar as larvas e para estimular a postura da rainha.
  • Há ainda a formula 2:1 ou seja, duas partes de açúcar e uma de água, o que cria um alimento mais solido, ideal para aplicar no inverno pois serve para as abelhas armazenarem esse alimento sem no entanto estimular em demasia a postura da rainha.*
 Independentemente dos racios utilizados, hà uma forma de fazer com que este alimento seja mais rico para as abelhas por "inverter" o açúcar. Mas o que é isso?


O que é o açúcar invertido

As abelhas ao visitarem as flores, coletam néctar rico em açucares simples (monossacarídeos), ou seja, grande parte deste açúcar é frutose e glicose. Apenas uma pequena percentagem (cerca de 5%) é sacarose (açúcar complexo designado dissacarídeo). Ora, o que acontece é que o açúcar branco é rico em sacarose. Para que se possa torna-lo em açucares simples é preciso ferver o açúcar em água, "partindo" assim a sacarose e tornando-o em açucares simples, glicose e frutose.O processo pode ser acelerado com a mistura de acido tartarico (vinagre) ou sumo de limão puro. Para além de ajudar na decomposição da sacarose, estes elementos ajudam a mistura a não oxidar tornando o prazo de validade do alimento mais prolongado.


Como preparar uma mistura de açúcar invertido

Imaginemos que você quer preparar alimento para simular a entrada de néctar para que suas abelhas desenvolvam a colmeia. Eis como eu o faço:
  1. Coloco pouco mais de 1 litro de água no fogão.
  2. Antes de levantar fervura coloco um 1kg de açúcar branco e adiciono  o sumo de metade de um limão ou adiciono 2 colheres de sopa de acido tartárico. Vou mexendo até tudo ficar completamente diluído.
  3. Após 15 ou 20 minutos de fervura em lume brando, retiro o xarope do fogão e deixo arrefecer.
A isto tudo eu costumo adicionar uma colher de levedura de cerveja misturado com o açucar pois nunca é demais dar um pouco de  protaína às abelhas.
Assim,  temos pronto o nosso xarope de açúcar invertido.
A razão de utilizar pouco mais de 1 litro de água prende-se que conto sempre com a evaporação de parte da água durante o processo de fervura. É importante que a fervura seja em lume brando pois quanto mais altas as temperaturas mais se desenvolve a molecula HMF (hidroximetilfurfural) que é toxico para as abelhas. Uma sugestão que é apontada mais recentemente é a de ferver por apenas 3 minutos [LEN03]. Mas em tão pouco tempo preciste a duvida se a "inversão" de açucar é significativa por isso continuo a optar por ferver por cerca de 15 minutos.


Alimentar nossas colónias com esse tipo de xarope facilita a aceitação das abelhas, aumenta o prazo de validade do xarope, é mais facilmente digerido pelas abelhas e fornecido às larvas e rapidamente estas reservas ficam "maduras" para as abelhas. 




* (Existem apicultores que defendem que a mistura 2:1 é uma especie de "anti-natura" pois na natureza não há um alimento energético para as abelhas com a compisição solida como essa. Argumentam que a energia que a abelha dispende para digerir e aquecer esse alimento é o mesmo que ganha nesses açúcares. Fica ao critério de cada um utilizar ou não este tipo de alimento sólido)
  
PS: Um bom vídeo de uma palestra que explica os riscos da alimentação com açucar invertido e não só.