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sábado, 25 de maio de 2019

Iberienses vs Lingustica

Mais importante do que o modelo de colmeia, do que o maneio, do que a flora, do que a sabedoria do apicultor, está a própria abelha.

Ora, nos Açores existem duas sub-espécieies predominantes de Apis Melífera. A Apis Mellifera Iberiences e a Apis Mellífera lingustica. (Jean Pierre na decada de 80 introduziu algumas outras sub-especies nos Açores mas com menor expressão) Na verdade não creio existirem quaisquer exemplar de Lingustica no seu estado puro,  mas sim um híbrido com predominância de genes de A. M. lingustica. Vulgarmente, os apicultores referem-se a essas como "abelhas amarelas" em contraste com as "abelhas pretas" ou " escuras" quando se referem a abelhas com predominância de genes iberiences. Mas qual a diferença entre uma subespécie e outra? Bem, a abelha lingustica tem sua origem em Itália, ou seja tem um passado muito ligado ao clima Mediterrâneo, o que significa que está adaptada a um clima quente. É a subespécie de abelhas preferida pela maioria dos apicultores do planeta. Possui uma língua mais comprida o que teoricamente contribui para chegar a flores mais profundas e, como tal, poderá ser à partida melhor recoletora de néctar, embora alguns estudo parecem não corroborar desse optimismo, principalmente quando a abelha italiana está fora do seu habitat de excelência, ou seja, climas mais quentes.

Por outro lado temos a Apis Mellifera Iberienses que é uma abelha que se adaptou ao clima específico da península Ibérica. É apontada como sendo um híbrido da Apis Melífera melífera e a Apis Mellifera intermissa natural do Norte de África. Teve muitos séculos ou até milénios a adaptar-se às características do território português e espanhol continental.

O debate nos Açores

Nos Açores existe uma disputa pelo direito de prevalecer a linhagem que veio do território continental português (iberiensis)  pois, segundo é defendido por alguns responsáveis da área apícola da região, esta sub-espécie está mais adaptada ao clima especifico dos Açores. Isto porque, segundo argumentam, esta sub-espécie teve meio milénio para se adaptar ás características especificas do Região. Será mesmo assim?
Se por um lado não deixa de ser verdade que a  abelha escura se tem adaptado há muito mais tempo à região, também é facto que esta também não é natural dos Açores. Por outro lado existe o argumento da seleção natural de meio século deste pretenso eco tipo. Será que é mesmo assim também? Lembremos que a abelha foi trazida para os Açores por apicultores logo no inicio da colonização das ilhas e desde então essas se têm essencialmente mantido debaixo da alçada de apicultores, sendo esses e não propriamente a natureza a selecionar as abelhas. Por isso, argumentar que as abelhas estão selecionadas pela natureza da Região é algo muito duvidoso pois sempre foram os apicultoras a fazer a manipulação da abelha e a selecionar segundo padrões próprios (produtividade ou mansidão por exemplo,) e não os padrões estabelecidos pelas condições edafoclimáticas.

 Quem defende a seleção genética da abelha escura, defende igualmente a descontinuidade da linhagem de abelhas amarelas pois "poluem" a genética da abelha escura. Mesmo assim, alguns apicultores não desistem proliferar a linhagem da abelha italiana pois, segundo argumentam, esta é mais produtiva.

A opinião de um mero apicultor

Eu pessoalmente ainda não vi motivos validos para desistir do apuramento das abelhas amarelas, isto porque apesar de ter sido trazida muito mais tarde para a região, (década de 80 do século passado) não deixa de ser uma abelha adaptável. No meu caso pessoal, usando os dois tipos de abelhas, tenho tido muito mais sucessos a nível de produção com as híbridas amarelas. Conheço alguns outros apicultores que corroboram da mesma opinião. Por outro lado, confesso que estas têm a tendência de ser mais agressivas e pilhadoras de outras colónias. (A lingustica pura é muito mais mansa do que a Iberiensis, mas a sua hibridação, torna-as na generalidade ainda mais agressivas que as iberiensis).
 É verdade que tentar apurar duas linhas distintas na mesma zona e tendo em conta que as ilhas são relativamente pequenas para apurar duas linhagens diferentes, acaba por ser um desafio manter puras qualquer das sub-espécies. Que fazer então? Sou da opinião que se devem fazer seleção sim de abelhas, dentro do possível, estabelecendo zonas para apuramento genético especifico. Em algumas ilhas a abelha italiana tem pouca ou nenhuma expresssão. lá sim devem se desenvolver esforços para apurar linhagens puras de iberiensis cada vez melhores. Nos outros territórios onde proliferam já os dois tipos de abelhas, não teremos outro remédio senão apurar aquilo que é possível, ou seja, as rainhas híbridas mais produtivas, mansas, resistentes a doenças etc.

Resumindo:
- A abelha amarela é um híbrido
R: A negra também o é (A. M. Intermissa e A.M. mellífera)

- A abelha amarela não é originaria das ilhas mas foi trazida para cá.
R: A negra também.

- Mas a negra tem séculos de adaptação à Região
R: na verdade a negra tem sido selecionada pelos apicultores e não pela natureza.

- A amarela é mais agressiva na generalidade
R: É também mais produtiva na generalidade


Estou aberto a abrir horizontes e posso não estar a ver "all the big picture" mas pelo conhecimento que me é dado até ao momento, tenho essa opinião.
Um abraço a todos os colegas apicultores.


3 comentários:

  1. ...All the big picture, "Apis Mellifera Azorica"...!!!

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  2. Caro Apicultor
    Antes de mais gostava de lhe congratular pelo seu blog, gosto dos temas que são colocados a disposição dos “apiconautas”…! Eu também sou apicultor e (apiconauta) e faço parte de um grupo de apicultores que tem vindo a fazer um trabalho árduo na apicultura no sentido de melhorarmos a nossa genética apícola existente com recurso a tecnologia de ponta, mais concretamente Inseminação Instrumental de Abelhas Rainhas, como também sou um dos responsáveis pelo pedido de Zona Indemne à Varroa nos Açores (inicialmente em São Miguel pois nas outras ilhas os testes sanitários não estavam completos) junto da Secretaria Regional de Agricultura e Florestas do Governo Regional, bem como iniciei um programa de melhoramento genético em São Miguel entre apicultores interessados em ter uma genética que não só possa trazer rendimentos que justifiquem todo o investimento empregue e utilizado na apicultura como também o gosto pela actividade “porque ninguém deixa a carteira com dinheiro ao relento”, e estamos fazendo um trabalho rigoroso e consciente, e como sou defensor e impulsionador de apurarmos e criarmos o que nos temos de melhor e esse melhor poderá ser aquilo que já disse e escrevi algumas vezes, “Apis Mellifera Azórica” estamos na europa isolados, com barreiras excepcionais sem parasitas ou doenças exóticas pelo menos na maioria das ilhas que possam prejudicar as nossas abelhas, mas infelizmente bem sabemos que os apicultores estão desapoiados nesse tipo de selecção genética por parte das Autoridades Agrícolas e Veterinárias, temos de ser nós a correr, vamos ser activos, vamos inovar, vamos dinamizar, ajudar os apicultores com um contributo realmente consistente e efectivo...!!!, e por isso prezo a sua opinião e o seu entusiasmo para continuar a impulsionar o gosto e a curiosidade pela apicultura entre os apicultores e os cibernautas…
    Com os melhores cumprimentos

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  3. Obrigado pelo seu comentário .
    De facto reconheço que desconhecia a aposta no reconhecimento da abelha açoriana como uma sub-espécie diferenciada. Igualmente desconheço os parâmetros para que tal se possa tornar possível mas certamente todos os apicultores, tal como eu, estaremos na expectativa de saber mais sobre isso.

    Com os melhores cumprimentos

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